Caso Samarco: derrota ambiental e social


Decisão recente da Justiça de Minas Gerais determinou a suspensão das licenças ambientais da Mineradora Samarco referentes ao complexo de Germano, em Mariana, na região central de Minas Gerais, onde ficava a barragem de Fundão. O pedido foi realizado pelo Ministério Público de Minas Gerais. Tal pedido ressalta que as permissões concedidas anteriormente a Samarco não obtiveram eficácia para o exercício das funções e, por força dessas circunstâncias e após o rompimento da barragem, a referida licença deve ser revogada.

Preliminarmente, há de se considerar que o licenciamento ambiental consiste no preenchimento de requisitos a serem utilizados pela Administração Pública. A finalidade dos requisitos é a manutenção do controle prévio sobre a construção, a instalação, a ampliação e o funcionamento dos estabelecimentos e atividades que se utilizem de recursos naturais.

O dano ocasionado pelo rompimento da barragem se deu em decorrência de motivos que ainda não foram conhecidos, não tendo elementos que comprovem a culpa exclusiva da Mineradora, afastando o notoriamente estar-se diante a uma situação de caso fortuito, que, conforme preleciona Helly Lopes Meirelles:

“Caso fortuito: é o evento da natureza que, por sua imprevisibilidade e inevitabilidade, cria para o contratado impossibilidade intransponível de regular execução do contrato. Caso fortuito é, p. ex., um tufão destruidor em regiões não sujeitas a esse fenômeno; ou uma inundação imprevisível que cubra o local da obra; ou outro qualquer fato, com as mesmas características de imprevisibilidade e inevitabilidade, que venha a impossibilitar totalmente a execução do contrato ou retardar seu andamento, sem culpa de qualquer das partes”.

Seria uma temeridade suspender a Licença Ambiental, sem a devida compensação ambiental. O próprio conteúdo disposto na PEC n.º 65 vem a acrescentar o parágrafo de nº §7º ao art. 225 da Constituição Federal, que irá assegurar a continuidade de obra pública após concessão de licença ambiental, garantindo a todos um direito ecologicamente equilibrado:

“Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações.

(...) § 7º. A apresentação do estudo prévio de impacto ambiental importa autorização para a execução da obra, que não poderá ser suspensa ou cancelada pelas mesmas razões a não ser em face de fato superveniente.”
Por vias, as longas e burocráticas licenças ambientais, a apresentação do estudo prévio de impacto ambiental e o preenchimento de requisitos impostos pela Administração Pública importarão na autorização para a execução do empreendimento. Logo, uma decisão a contrário sensu seria uma afronta as novas diretrizes constitucionais.

É necessário pontuar que as licenças obtidas pela Samarco atenderam as condições da legislação vigente, estando, portanto, apta a produzir seus efeitos no que concerne as suas atribuições.

Nesta esteira, há de se considerar que a Administração Pública no uso das suas prerrogativas, dispõe do Poder de Polícia “para condicionar e restringir o uso e gozo de bens, atividades e direitos individuais, em benefício da coletividade ou do próprio Estado” (MEIRELLES, Helly Lopes. Curso de Direito Administrativo. 23º edição), devendo observar os requisitos da discricionariedade quanto à conveniência e oportunidade da sua atuação, devendo adotar as medidas necessárias à atenção da legislação vigente.

No caso em tela, deve ser observada a relevância dos direitos envolvidos, podendo ser facilmente verificado os aspectos individuais quanto os aspectos coletivos. Sob a ótica dos direitos individuais, há de se levar em consideração a questão dos funcionários que se mantém em uma relação de emprego perante a Mineradora, o que traria um prejuízo enorme para a sociedade. Nesta senda, se cogitar a possibilidade de uma suspensão da licença, geraria uma demissão em massa, fazendo com que o mercado local e regional sofresse graves consequências.

Salientando que o momento econômico e político é inoportuno, visto a atual situação econômica predominante no país, que, segundo o jornal Folha de S.Paulo, conforme dados divulgados pelo IBGE nos últimos dois meses, o percentual do desemprego chega a 11,6%, equivalente a aproximadamente 11.85 milhões de pessoas, sendo considerado um recorde.

No giro dos direitos coletivos, faz-se mister referir que é imprescindível a continuidade dos serviços executados pela Samarco para que se crie estratégias e mecanismos a fim de recompor o dano ambiental ocasionado, suportando assim, as despesas de prevenção, reparação e repressão dos danos ambientais, em observância ao Princípio do Poluidor-pagador.

Nesse contexto, se a empresa fica impedida de atuar, dificulta sua contribuição para a reparação do dano ocorrido. Desta forma, a revogação de uma licença dessa magnitude representa uma perda ambiental, bem como caracteriza uma perda social.


Autoria : Rubens Sergio dos Santos Vaz Junior é sócio e advogado responsável pelo Núcleo Ambiental do escritório Lapa Góes e Góes Advogados, doutorando na condição de aluno especial na Universidade Católica do Salvador (Ucsal), doutorando em Ciências Jurídicas e Sociais pela Universidade Católica Argentina (UCA), mestre em Planejamento Ambiental pela Universidade Católica de Salvador, especialista em Processo Civil pela Universidade do Salvador e em Direito Público do Estado, professor das Faculdades Unifacs, Ruy Barbosa e Unijorge e autor do livro “Responsabilidade civil pela não inclusão de critérios ambientais nas licitações públicas”.